23.6.12

De peito aberto



Entre os peixes azulados na Praia de Botafogo, protestos e manifestações nas ruas do Centro, e discussões – mais ou menos – acaloradas no Riocentro, a Rio+20 vai chegando ao fim. Mas a mídia, que nada de boba tem, arrumou alguns temas prosaicos para chamar a atenção de quem pouco se conectou à importância dos temas discutidos na cidade nos últimos dias. E desta forma, encontraram uma musa para a Conferência Rio +20.

O ato legítimo da cearense Brígida de Souza – que tirou a blusa por conta do calor insuportável que atingiu a todos numa passeata na Avenida Rio Branco – me fez lembrar, com um saudosismo que me acomete de tempos em tempos, da rebeldia e a falta de pudor de uma das grandes intérpretes que este país já produziu: Cássia Eller. Até os dias de hoje, me lembro com clareza de um show da Cássia, no falecido Canecão, em que ela, a certa altura do show, provocava a plateia colocando seus mamilos à mostra. Era o seu “Veneno AntiMonotonia” para o preconceito social reinante ao mesmo tempo em que prestava uma belíssima homenagem às canções de outro rebelde sem igual chamado Cazuza.

Era o ano de 1997 e Cássia Eller, enfim, começava a conquistar o respeito de público e crítica com suas interpretações ímpares e um repertório variado mas ao mesmo tempo extremamente identificado com sua personalidade plural e desafiadora. De “Por Enquanto” (Renato Russo) a “Non, Je Ne Regrete Rien” (lembrada na voz de Edith Piaf), passando por “Na Cadência Do Samba” (Ataulfo Alves e Paulo Gesta), Cássia sempre se fez presente em interpretações únicas com sua voz rascante e métrica própria colocando-a num patamar muito distante das cantoras de sua época.

Quase comouma curva fora do ponto, Cássia Eller foi conquistando admiradores a cada música gravada. Indiscutivelmente, seu auge se deu poucos meses antes de sua morte trágica, com o lançamento do disco “Acústico MTV” lançado em março de 2001, ganhador de um Grammy Latino como “Melhor Disco Brasileiro de Rock” e um dos vinte álbuns mais vendidos no Brasil no ano de 2002.

Em 2012, Cássia estaria completando 50 anos. Mal consigo imaginar o que ela teria aprontado nestes últimos dez anos. E pensando um pouco desta forma, e com opropósito de homenageá-la, é que o documentarista Paulo Henrique Fontenelle – o mesmo realizador de “Loki – Arnaldo Baptista” sobre a vida do ex-Mutantes – está reunindo material sobre as passagens de Cássia pelo Rio de Janeiro e outras cidades em que viveu em sua vida itinerante. Como por exemplo, sua primeira residência no Recreio dos Bandeirantes tentando emplacar a carreira artística e o sítio que dividiu com o guitarrista Walter Villaça, na antiga Rio-São Paulo. Registro merecido e à altura da sua importância para a história da nossa música.

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